Press commentary

Inédito em Portugal, onde as questões dos direitos das mulheres têm sido tratados como temas menores, a maioria dos artigos políticos de fundo sobre a vida política nacional, em todos os sectores ideológicos, fazem referência à questão do aborto em Portugal. Seguem-se algumas frases destes comentadores em jornais de grande peso político na direita liberal e centrista portuguesa.

Definitivamente, a iniciativa Women on Waves / Ondas Portuguesas abalou a coligação governamental.

(Santana Lopes abre e fecha: mostrando fragilidade da coligação governamental)

A posição inicial de Santana Lopes, no dia 2 de Setembro, à saída da reunião com o Presidente da República, parecia abrir caminho a uma postura mais aberta e não dogmática por parte de Santana Lopes. Esta posição foi felicitada por comentadores políticos ligados ao sector liberal.
Por outro lado, o volte-face de Santana Lopes no dia seguinte, pouco mais de 24 horas depois, à saída do Conselho Nacional do PSD, vem colocar em muito maus lençóis os sectores mais liberais no seio dos sociais-democratas.
Também o facto de esta semana Santana Lopes ter vindo admitir a revisão da lei do aborto aparentemente até sem necessidade de referendo pode indiciar preparativos para a entrada, desde já num ciclo eleitoral.

-SEMANÁRIO, dia 3 Set 2004, pág. 11

Santana Lopes: não tem receio de tomar posições arrojadas e que não se deixa limitar por tabus ou questões de mera forma ou legalidade. Os políticos não têm de ser escravos da lei que fizeram, deu Santana a entender. Se o tempo é novo, se as opiniões são novas, se o saldo da aplicação da lei actual sobre o aborto é negativo, é tempo de mudar a lei. Sem receios nem preconceitos.

-SEMANÁRIO, dia 3 Set 2004, pág. 6, artigo de Paulo Gavião

Portas perdeu o confronto do barco do aborto
Santana Lopes percebeu rapidamente que Portas e o PP perderam em toda a linha e que só restava o caminho da defesa da tolerância e da abertura na área dos costumes, de modo a poder salvaguardar alguma coisa na área da autoridade do Estado. (∑) Aqui, Santana Lopes sentiu que tinha que romper e que poderia mesmo romper. E, por um dia, os telejornais deram a imagem de um Primeiro Ministro que desautorizava a coligação e desmentia os compromissos do Governo, anunciando um novo tempo, liberdade e evolução legal.

-SEMANÁRIO, dia 3 Set 2004, pág. 7, Editorial de Rui Teixeira Santos

Estalou, de forma pouco edificante, a primeira polémica entre o Presidente da República e o novo primeiro-ministro. Não é por aqui que vão azedar as relações entre um e outro, mas é um pequeno sintoma preocupante. Se não for sustido e enquadrado pelos interesses superiores do Estado pode deflagrar em algo muito mais grave.
O Governo resolveu impedir a entrada em águas territoriais portuguesas e atracar num dos nossos portos, uma embarcação holandesa, cujos objectivos declarados era o de apoiar e esclarecer aspectos da interrupção voluntária da gravidez, junto da opinião pública. Os responsáveis pela embarcação declararam ter a bordo os meios suficientes para fazer abortos e medicação apropriada de carácter abortivo.
Não sabemos, exactamente, as razões pelas quais o barco resolveu quebrar a pacatez portuguesa e ressuscitar um tema que não está encerrado, mas que tem um quadro legal que não suscita graves reparos sociais e políticos. O certo é que as intenções declaradas vieram agitar todos os meios políticos.

-SEMANÁRIO, dia 3 Set 2004, pág. 10, artigo de Pedro Cid

Primeiro-ministro recua no aborto
O líder do PSD disse ontem o que não tinha dito na véspera: a lei é para manter até 2006.
O primeiro-ministro e líder do PSD levou pouco mais de 24 horas a clarificar a sua posição sobre as mudanças à lei do aborto. Na quarta-feira, após uma audiência com o Presidente da República explicou por que o governo impediu a entrada em Portugal do «barco do aborto», admitiu que «as leis não são estáticas» e que o debate deveria fazer-se no início do ano parlamentar, em Setembro. Abrindo claramente a porta a uma reapreciação da lei. Ontem corrigiu o tiro. No final do Conselho Nacional do PSD que marcou o congresso Nacional do PSD que marcou o congresso para Novembro, em Barcelos, o presidente social-democrata disse o que não dito na véspera, no Palácio de Belém: «o PPD/PSD honra os seus compromissos e não será, nesta legislatura 2006 nenhuma alteração relativa à interrupção voluntária da gravidez.» Um compromisso que decorre do acordo de coligação governamental com o CDS/PP.
(No entanto, Santana diz que não quer impor qualquer posição aos militantes do PSD, que terão liberdade de voto quando o assunto voltar a ser discutido.)

-Diário de Notícias, 3 Set 2004, pág. 6, artigo de Nuno Simas (com uma nota de Graça Henriques e Fernanda Câncio).

A coligação vai resistindo, com Santana Lopes a recuar em matéria de aborto, para manter os compromissos com o PP depois de ter aumentado o confronto com o Presidente da República e depois das surpreendentes declarações do Primeiro Ministro à saída de Belém. Percebe-se que o PSD não pode deixar Paulo Portas, para uma eventual coligação com o PS de Sócrates.

-SEMANÁRIO, 3 Set. 2004, pág. 3

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